sexta-feira, 22 de junho de 2012

NA COLÔNIA SANTA ISABEL - LAGES WEG - parte 3


Raimund Jacobi tinha seu lote no caminho das tropas (Lages Weg), estrada que ligava Lages (serra) a São José (litoral), conforme registro de batismo/nascimento de seu filho Albert em 1866. Essa estrada começou a ser aberta em 1787. Nela trafegavam tropas de mulas para comércio de produtos variados entre as duas cidades e adjacências.

Conta Luiz Cruz que “os tropeiros eram os homens de negócios, que compravam e vendiam. Alguns produziam em suas propriedades. Circulavam por infinitas trilhas e caminhos, subindo e descendo serras, atravessando rios e riachos. Abasteciam os povoados de novidades, de utensílios e variedades. Tinha até tropeiro joalheiro. Além de vender de tudo um pouco, em muitos lugares o tropeiro levava e trazia notícias ou mensagens. Os tropeiros circulavam de norte a sul, de leste a oeste.”


Tropeiro com sua tralha, bruacas, cofres, ...
Acervo do Museu de Artes e Ofícios de Belo Horizonte MG

Devido aos ataques indígenas a que os tropeiros estavam sujeitos foram fundadas colônias ao longo da estrada, a colônia Santa Isabel em 1847, a colônia Militar Santa Thereza (atual município de Alfredo Wagner), a colônia Angelina e finalmente colônia Teresópolis em 1860. Era um caminho bem movimentado, que possibilitava o comércio entre os colonos que produziam batatas, milho, feijão, café, algodão e os tropeiros que traziam sal, tecidos, açúcar. Ao se instalarem na colônia Santa Isabel (ponto verde no mapa abaixo), próximo ao caminho das tropas, os colonos trocavam, vendiam e compravam produtos com os tropeiros.

Alcides Goularti F° e outros

Frades franciscanos em 1891 descrevem uma tropa na Lages Weg. “Era uma tropa de mais ou menos 50 burros carregados, dos quais cada qual carregava 90 quilos. Vários desses animais pareciam bem sujos e judiados e de alguns dos quais tinha sido retirada a carga que levavam no lombo ensanguentado. O caminho para o Planalto, que tem uma altitude de 800 metros .. é terrível... O caminho é perigoso e muito penoso, passa pela mata virgem, chamada de picada, pelos altos morros. Segundo a época do ano e a situação climática, dura a viagem até o campo, como chamavam aqui as pastagens do planalto, 8 a 14 dias. Em tempos de chuvas com rios transbordando e que não podem ser atravessados, pois pontes aqui não existem na mata virgem, a viagem pode durar semanas inteiras. Pior do que as dificuldades da viagem, seriam aquelas com os índios ...”

tropeiros em Alfredo Wagner (SC)

No Brasil nos séc. XVII, XVIII e XIX parte do comércio era realizado pelas tropas de mulas que atravessavam o país com mercadorias e gado ou que seriam elas mesmas comercializadas em feiras. O mais conhecido caminho de tropas era o de Viamão-Sorocaba. As mulas vinham da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul e iam pra a feira de Sorocaba, onde eram comercializadas. Essas mulas tinham como destino final as Minas Gerais e o trabalho nas minas de ouro na região de Ouro Preto. Para isso atravessavam todo interior dos atuais estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, onde tinham alguns pousos certos e regiões de invernada, para descanso e engorda das mulas e gado. Essas paragens provocaram o nascimento e crescimento de algumas vilas no estado do Paraná na região dos Campos Gerais, cidades como Lapa, Castro, .. onde hoje existe o turismo tropeiro, com museus e restaurantes com comida tropeira, feijão tropeiro, paçoca de carne, torresmo, farinha de mandioca, …


Tropeiros - Debret
Acervo Museus Castro Maya IBRAM/Minc

Cada tropa tinha aproximadamente 50 animais algumas foram bem maiores, cada comitiva era dividida em lotes de 7 animais, com um homem cuidando de cada lote com gritos e assobios. Encabeçando a tropa ia a madrinha, mula ou égua mais antiga, líder entre os muares. Ela ia enfeitada com fitas e guizos ou cincerros. Escreveu o viajante Saint-Hilaire que “ no silêncio das matas ouvia constantemente o eco das vozes dos tropeiros e o ruído dos guizos da madrinha da tropa, mula predileta que guia fielmente a caravana, a cabeça ornada de panejamentos coloridos tendo ao alto uma pluma ou uma boneca.”

Peitoral com cincerros
Acervo do Museu de Artes e Ofícios de Belo Horizonte


Essa era a algazarra que Raimund Jacobi e família ouvia nas margens da Lages Weg enquanto morou na colônia Santa Isabel.


Acervo do Arquivo Público do Paraná

No mapa acima (com alterações para melhor visualização):
- no extremo sul, circundado por cor verde a cidade de Viamão, início do principal caminho de tropas que ligava o Rio Grande do Sul à grande feira da cidade de Sorocaba-SP
- a segunda cidade circundada por cor verde é Lages na serra catarinense, de lá saia o ramal para o litoral (São José), a Lages Weg em roxo
- o caminho de Viamão seguia em direção ao norte, passando por Curitibanos, Rio Negro, Lapa, Ponta Grossa, ...., Sorocaba, ...

Aqui, veja lindas fotos da antiga estrada de Lages.

Bibliografia:
http://alfredowagnertq.blogspot.com.br/
Cruz, Luiz _ Memória tropeira, in Revista de História da Biblioteca Nacional, 
http://www.revistadehistoria.com.br/secao/artigos/memoria-tropeira
Goularti F°, Alcides e outros - Integrando o território catarinense: a construção da estrada de Lages,
http://www.aguasmornas.sc.gov.br/noticias/lages.pdf
Jochem, Toni Vidal - Pouso dos imgrantes - Florianópolis, Papa-livro, 1992.
Suprinyac, Carlos Eduardo _ Um meio de fazer fortuna, in Revista de História da Biblioteca Nacional
http://www.revistadehistoria.com.br/secao/artigos-revista/um-meio-de-fazer-fortuna