terça-feira, 25 de agosto de 2015

E ERNESTO CAPOZZI ERA .....


CARPINTEIRO !!!

E já que estamos falando de fazendas vamos continuar no assunto, porém mudando de personagem. Por ocasião do nascimento de José Capozzi em 1905 na Fazenda Grama, em Taquaritinga, o pai Ernesto Capozzi, compareceu ao cartório e declarou em sua qualificação:
"... lavradores, residentes nesta vila ..."
Por ocasião do nascimento do  filho Thomaz, em 1907, um empregado da Fazenda Grama, na qualificação do pai, declarou:
"... aquele artista, residentes neste município ...."
Por ocasião do nascimento do filho Alfredo I, em 1911 na mesma Fazenda Grama, um empregado da fazenda declarou que o pai da criança era:
".... carpinteiro, residentes neste distrito ...."
Artistas eram os carpinteiros. Ernesto chegou ao Brasil carpinteiro, era  falegname desde a Itália. Nas fazendas paulistas, a carpintaria era atividade certa, muitas possuíam serrarias próprias, uma maneira de se auto gerir. Sobre as serrarias e outras oficinas, escreveu Benincasa:
"Eram oficinas essenciais ao funcionamento das fazendas. Ali se fabricavam e davam manutenção  aos carros de boi, carroças, carroções, ... Ali se fabricavam as janelas, portas, se aparelhava o madeiramento para a estrutura das edificações e sua cobertura e o assoalho rudimentar." (v.1)
  
Serraria e marcenaria da Fazenda Concórdia em Itú, foto de Vladimir Benincasa.

Em carta ao editor do jornal Cidade de Taquaritinga em agosto de 1981, Antônio, filho de Ernesto Capozzi, escreveu sobre o pai:


Assim, acredito que, em algum momento da sua vida, antes de vir para a cidade de São Paulo, Ernesto Capozzi saiu da Fazenda em que residia e passou a exercer sua atividade de forma independente na região urbana do município.

No entanto, Ernesto não foi citado no verbete Taquaritinga do Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial de 1906, aqui, tampouco no de 1912, veja aqui.

O livro Cem anos de Tradição de Luiz Carlos Beduschi, que trata da história da Loja Maçônica Libero Badaró de Taquaritinga, cita nosso bisavô Ernesto Capozza. Onde ? Quando faz referência à construção da Santa Casa de Taquaritinga em 1910 !
"A motivação e o entusiasmo contagiava a todos, visto que em menos de vinte dias, as propostas apresentadas para a colocação de assoalho, forro e janelas foram analisadas. das três propostas apresentadas, foi considerada vencedora a formulada pelos senhores Miguel Tarsitano & Ernesto Capizza (sic). Fica estabelecida a data de 15 de outubro para conclusão dos serviços, que serão fiscalizados pelos senhores Victorio Frontini e Joaquim Venâncio Cardozo." (pg. 66)
Ano cheio !! O senhor Miguel Tarsitano não era de Taquaritinga, era de Catanduva-SP, a 70 km. da cidade, onde comerciava madeiras e materiais de construção em geral, veja aqui, no Almanak Laemmert-RJ de 1908, provavelmente fornecedor de matéria-prima para nosso querido carpinteiro.



Após  mudar para a cidade de São Paulo, Ernesto foi comerciante. Veja abaixo no seu Atestado de Óbito.


Seu neto Sérgio Capozzi (filho de José), diz que seu irmão Ernesto (o filho mais velho de José) "lembra de ter visto o vovô lidando com rolos de tecidos e que seguramente na década de 40 ele já não trabalhava. Eu também me lembro vagamente de meu pai mencionar que o vovô mexia com tecidos quando morou na rua Conselheiro João Alfredo, na Móoca."

O bairro Móoca era cheio de fábricas de tecidos. A ind. textil foi das mais importantes no início da industrialização da cidade de São Paulo, afinal foi uma das primeiras indústrias a serem mecanizadas. Além disso, a sacaria era (e é) importante para o transporte do café. No final do séc. XIX várias indústrias têxteis se estabeleceram no próprio bairro e adjacências, entre elas:


Foto Douglas Nascimento, daqui

Tecelagem Labor, na rua da Móoca, foto acima


1924, Cotonifício Crespi, acervo Fund Energia e Saneamento, foto daqui

Cotonifício Crespi, na rua Javari, foto acima

Tecelagem na rua Orville Derby

Tecelagem Três Irmãos Andraus

Fábrica Santana

Tecelagem Mariângela, do Grupo Matarazzo

Alpargatas

Cia Nacional de Tecidos de Juta, no Belenzinho

Fontes:

Livros  do Registro Civil de Taquaritinga e São Paulo

Benincasa, Vladimir - Fazendas Paulistas, arquitetura rural no ciclo do café, veja aqui

Beduschi, Luiz Carlos - Cem anos de Tradição, Taquaritinga: Augusta e respeitável Loja Simbólica "Libero Badaró", 2000, 284 p.

jornal Cidade de Taquaritinga, 1981

Sobre as tecelagens no bairro da Móoca: Revista Minha Cidade, Site São Paulo Antiga

Gunn, Philip e Correia Telma de B. - A industrialização brasileira e a dimensão geográfica dos estabelecimentos industriais

Obrigada Seomara, Sérgio e Ernesto Capozzi !!


terça-feira, 18 de agosto de 2015

COMO ERA VIVER NUMA FAZENDA DE CAFÉ ? PARTE 2


Não encontrei nenhuma referência às fazendas em que viveram os Siggia (Fazenda São Domingos) e os Capozzi (Fazenda Grama) em Ribeirãozinho (Taquaritinga), mas encontrei referências a outras fazendas cafeeiras da região.
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Abaixo, planta da Fazenda Santana em São Carlos (SP), daqui.



Grande parte das fazendas de café paulistas foram formadas a partir das antigas fazendas de cana-de-açúcar. Uma fazenda cafeeira, mais especificamente, contava com:

1. Tanques para lavar e terreiros para secar o café
2. Edificações do beneficiamento, como tulhas e casas de máquinas, onde os grãos eram armazenados e  beneficiados
3. Depósito, oficina, serraria
4. Colônias para os trabalhadores, nas mais antigas as senzalas
5. em algumas delas, Capela e Escola
6. Casarão
7. Casa do administrador
8. Armazém
9. Pomar, horta, galinheiro, estábulos, ......

A colônia era o agrupamento  de casas onde residiam os trabalhadores, os camponeses, os nossos. Eram casas pequenas com sala, dois quartos e cozinha. Segundo Benincasa
"São casas, em geral, geminadas, ou formando renques com maior número de casas, telhados com duas águas caindo para a frente e aos fundos da edificação.  Por vezes é acrescentado um cômodo na parte posterior, ocupado pelas cozinhas, quase sempre sem banheiros internos. A origem dessa configuração é obscura; podemos pensar em adaptação da choça africana" (v.1, pg.166)
" ... casas pequenas e singelas, sem forro, com piso de terra batida que, aos poucos iam sendo revestidos de tijolos ou uma  camada fina de cimento, contendo o básico a uma vida cotidiana que se dava muito mais em ambientes externos que internos. As lides diárias estavam voltadas aos cuidados com as pequenas criações de animais, ao cultivo das hortas e ao trabalho nas fazendas, tanto de homens, quanto de mulheres e crianças. A casa de colônia era, antes de tudo, um abrigo, e não local de fruição de espaços, e as atividades de preparo de alimentos e descanso eram as suas principais atribuições."(v.1)


Casas de colonos na Fazenda Atibaia em Campinas.


 Casas de colonos na Fazenda Iracema em Campinas.
As fotos são de Vladimir Benincasa, veja aqui.

Numa  pequena vila desse tipo provavelmente viveram os Siggia logo que chegaram ao Brasil, na Fazenda São Domingos em Taquaritinga. Numa casa simples como essas, já em outra Fazenda da região, a Fazenda Grama,  nasceram os filhos mais velhos de Agnese Siggia e Ernesto Capozzi, Amélia, Luiza minha avó, Antônio, José, Thomas,  Albino.

Segundo o pesquisador Milve Peria, de Taquaritinga, essas ´duas fazendas eram produtoras de café até o início do séc. XX, atualmente as estruturas da época foram substituídas, os proprietários são outros e o café não existe mais. Elas são localizadas na região leste de Taquaritinga.

Para saber um pouco mais sobre José Ramalho, clique aqui.

Sobre as fazendas de café paulistas, o trabalho de Vladimir Benincasa é primoroso, detalhista e fartamente ilustrado. Apesar de ser  uma tese de doutoramento possui linguagem leve e acessível. Para quem se interessar pelas velhas fazendas cafeeiras, recomendo a leitura, são dois PDF's disponíveis aqui.

Quem quiser visitar fazendas históricas, antes que acabem, algumas delas estão adaptadas ao turismo rural, veja aqui.

Para saber mais sobre a história de Taquaritinga, clique aqui, o site Nossa Taquaritinga, do sr. Milve Peria, a quem agradeço muito pelas informações que me passou.

Outro site de conteúdo interessante é o do jornal  Tribuna de Taquaritinga, clique aqui.









terça-feira, 11 de agosto de 2015

COMO ERA VIVER NUMA FAZENDA DE CAFÉ ? PARTE 1

Não devia ser fácil, não !

Em primeiro lugar, muitos imigrantes não eram de origem rural. Como o nosso Giuseppe Siggia que era pedreiro e seu cunhado Emanuelle Cosentino que era sapateiro ... eles não deviam ter muita intimidade com a roça. 

A estrutura e a organização do dia a dia eram completamente diferentes da que estavam acostumados.
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Quando chegavam, os colonos firmavam um contrato com os proprietários, onde cada família de imigrantes deveria cuidar em média de 5.000 pés de café. Para famílias numerosas e com homens jovens era mais fácil ...  Para isso recebiam um pagamento.  Na época da colheita das cerejas existia um segundo pagamento, nessa época toda família trabalhava, inclusive as mulheres e crianças. O pagamento era feito por alqueire de grãos coletados. Os imigrantes também recebiam pagamento a parte caso trabalhassem no beneficiamento ou transporte do café.


Colono recebendo pagamento, foto do livro de Holloway.

Os fazendeiros permitiam o cultivo de milho, feijão, arroz, batatas, ... e também alguma criação, para consumo próprio. Se houvesse excedente, alguns fazendeiros permitiam que repassassem  para as "vendas" da região. Mesmo assim, em alguns casos, os imigrantes estavam sujeitos a ...
"dependência econômica do Armazém da fazenda e consequentes endividamentos progressivo, falta de assistência médica ou religiosa, proprietários e administradores despóticos e isolamento imposto pelo regime de trabalho." Truzzi
Os lavradores anteriores eram os escravos que  recebiam um tratamento bastante desumano. Porém, alguns fazendeiros, acostumados, tratavam o imigrante da mesma forma, o que gerava  problemas.
"Em um dos episódios mais sérios e de ampla repercussão na colônia italiana, o próprio irmão do presidente Campos Salles tombou sem vida após a reação de um colono que procurara defender sua família das investidas do administrador contra sua irmã, em uma fazenda em Analândia no ano de 1900." Truzzi
Essas dificuldades faziam com que os imigrantes mudassem de fazenda (será que algum dos nossos mudou ?), mudassem para um centro urbano (Ah!  Sim, isso eles fizeram), mudassem de país (Argentina, por exemplo, não, isso não fizeram), ou retornassem à velha pátria (Isso fez nosso trisavô Giuseppe Siggia).


Café, de Portinari, natural de Brodowski na região de Ribeirão Preto, acervo MNBA no Rio de Janeiro.

A primeira foto é daqui

Fontes:

Holloway, Thomas - Imigrantes para o café, 1984, Paz e Terra.

Truzzi, Oswaldo - Identidade étnica entre italianos no mundo rural paulista, 2013, disponível online em pdf, aqui


terça-feira, 4 de agosto de 2015

A CHEGADA DOS SIGGIA NA FAZENDA DE CAFÉ


Consta no livro da Hospedaria que a família foi encaminhada para a fazenda de José Ramalho & Irmão em Guariba, veja aqui.

Porém, não encontrei referência ao fazendeiro José Ramalho em Guariba e sim na região de Ribeirãozinho, atual Taquaritinga. 


Taquaritinga 1917

Mapa (modificado), acervo do Arquivo Público do Estado de São Paulo, clique aqui.

A fazenda de José Ramalho e Irmão na região de Taquaritinga era a Fazenda São Domingos, veja aqui.  Provavelmente a família foi encaminhada à estação ferroviária de Guariba porque era a mais próxima de Ribeirãozinho, que na época (1897)  ainda estava fora da malha ferroviária.

Então, da estação Guariba a família foi para a fazenda São Domingos, em Ribeirãozinho, talvez num carro de boi ou numa carroça.


Mapa aqui

Assim, a família desembarcou do vapor San Gottardo em Santos, embarcou numa maria-fumaça com destino a Hospedaria dos Imigrantes, localizada na estação Braz da The São Paulo Railway. Permaneceu por algum tempo na Hospedaria, de onde partiu para a estação Guariba. 


Estação de Guariba, 1915, foto daqui.

A estação de Guariba é de 1892, fazia parte do ramal de Jaboticabal da Cia Paulista.  Com a chegada do trem cresceu o vilarejo, hoje a cidade de Guariba.

A estação de Ribeirãozinho é de 1901, pouco tempo depois da fundação da cidade. Fazia parte da linha tronco da Estrada de Ferro de Araraquara (EFA).

Taquaritinga foi elevada à condição de município em 1892, anteriormente o povoado pertencia à comarca de Jaboticabal.

Fontes:

Site Estações Ferroviárias do Brasil, excelente !

Martins, Ana Luiza - Guariba, 100 anos